(Artigo publicado originalmente em “O Ponto Base” em 14 de Março de 2013)

Existe realmente uma gama de assuntos capaz de provocar as mais apaixonadas discussões, e evocar os mais primitivos instintos animais entre os participantes do debate, sem que se chegue jamais a um consenso satisfatório. Ultimamente, anexei à já bem conhecida tríade futebol-política-religião, um dos assuntos que mais me apaixonam, e que geram mais curiosidade entre meus interlocutores: a Análise Técnica.

Embora meus primeiros trabalhos no mercado financeiro tenham se baseado muito mais em alicerces macroeconômicos e fundamentalistas, a Análise Técnica sempre me fascinou. Dois fatores decisivos contribuíram para isso. O primeiro, em 2001, foi a minha sorte em ser chamado para trabalhar ao lado do melhor analista técnico do Brasil na época, meu amigo Márcio Noronha, um mestre no assunto. O segundo, é essa minha insistência em abrir a cabeça e me aprofundar nos assuntos que me causam estranheza e que pareçam polêmicos, ao invés de negá-los a priori.

Mas e então, funciona ou não?

Se alguém lhe mostrasse uma chave de fenda e lhe perguntasse: Isso funciona? Você obviamente responderia que sim. Passados alguns minutos, seu interlocutor poderia estar lhe amaldiçoando por não conseguir colocar um prego na parede com a ferramenta que você garantiu que funcionaria.

Imagem de pessoa tentando usar chave de fenda para pregar um prego análise técnica

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Exageros à parte (pois até hoje, felizmente, não conheci ninguém tão intelectualmente prejudicado a ponto de querer martelar um prego com uma chave de fenda), percebo que o erro que muitos cometem ao julgar rapidamente a Análise Técnica, ou qualquer outro assunto polêmico, assenta-se na mesma premissa. Em geral, as respostas são menos importantes do que saber formular as perguntas corretamente.

Assim como uma chave de fenda funciona muito bem quando a usamos para parafusar, e um martelo funciona muito bem quando o usamos para martelar, a Análise Técnica funciona muito bem, para quem sabe por que, quando, e como utilizá-la.

É preciso reconhecer que a maior parte da responsabilidade por esse preconceito contra a AT parte exatamente daqueles que mais deveriam zelar por ela: Os analistas técnicos. Infelizmente, a imensa maioria dos que assim se intitulam, não merece essa denominação.

Por se tratar de assunto não devidamente chancelado pela ciência, abundam os amadores e aqueles que gostam de cortar caminho, com pressa de obter resultados. Essa atitude faz com que sejam publicados “trabalhos” sofríveis sob o nome de Análise Técnica, o que leva muitos a realizarem diversas perdas no mercado, colaborando ainda mais para cercar o tema de uma aura de charlatanismo. O que escapa à percepção de alguns é que o charlatanismo está em alguns analistas, e não na AT em si.

Por vezes, devidamente recolocados frente à realidade pelo mercado, este que o grande filósofo Bill Bonner costuma sabiamente chamar de “o grande humilhador”, essas almas incautas e despreparadas se apressam em imitar a atitude da raposa da fábula de Esopo, e declaram em alto e bom som: As uvas estão verdes. As always, there is no free lunch.

Talvez então, a pergunta correta não seja se a Análise Técnica funciona, mas sim, se o analista funciona.

O preço

Existem, obviamente, muitas outras razões que deixam algumas pessoas avessas à AT.

Por exemplo, embora façam uso intensivo de gráficos em seu trabalho, muitos teóricos (incluindo alguns da área econômica) acham risível a idéia de que um gráfico de preços possa oferecer informações valiosas para tomada de decisões de investimento. O que a maioria deles desconsidera nessa avaliação apressada, é que o PREÇO é o mais importante componente de todos os mercados.

O preço é o ponto de acordo entre as forças de oferta e demanda, aquilo que o mercado considera, naquele momento, justo, tanto para o comprador, como para o vendedor, portanto, não existe NADA mais importante do que o preço para determinar o que está influenciando um ativo. Se as forças de demanda superam as de oferta, o preço sobe, e vice-versa. E é ao estudar a dança dos preços ao longo do tempo, que o analista começa a perceber padrões.

Um dos meus objetivos aqui será o de tentar trazer à você, leitor, uma visão realista e pragmática do que é, e de como funciona a Análise Técnica, para que você nunca precise passar pela frustração de usar uma chave de fenda para martelar um prego. Metaforicamente falando, é claro. Sem ofensas.

Análise Técnica e Análise Gráfica

Para começar, precisamos entender a distinção entre análise técnica e análise gráfica.

A Análise gráfica procura avaliar os padrões desenhados nos gráficos de preços, tentando extrair desses padrões, informações que possam auxiliar na tomada de decisão. É desse universo que deriva o estudo das chamadas “figuras”, como as bandeiras, flâmulas, triângulos, e o famoso OCO (ombro-cabeça-ombro).

Já a Análise Técnica inclui (mas não está limitada a) a Análise Gráfica. Ela utiliza cálculos matemáticos, alguns mais simples, outros mais complexos, com o mesmo objetivo, ou seja, extrair dos cálculos, informações que auxiliem o processo de tomada de decisão. É desse universo que derivam elementos como os rastreadores de tendência e os osciladores, por exemplo.

Ou seja, enquanto a Análise Gráfica é estritamente visual, a Análise Técnica engloba também a matemática e a estatística como ferramentas de avaliação dos padrões de comportamento dos preços. Um bom Analista Técnico sabe que esses cálculos são muito mais importantes do que as figuras (fica a dica).

Prevendo o Futuro

O ponto mais importante para que possamos tirar bom proveito da Análise Técnica, é abandonar completamente a idéia de que com ela poderemos prever o futuro dos preços.

Mas então, não estou entendendo, Jonas. Se a Análise Técnica não pode prever o futuro dos preços, para que raios ela serve? Ah, você nem imagina como fico feliz de que você tenha perguntado, pequeno gafanhoto.

O grande potencial da análise técnica está em nos oferecer pontos de entrada e saída onde as PROBABILIDADES de acerto são maiores do que os 50% que teríamos jogando cara ou coroa com uma moeda.

Oh….decepção. 90% dos participantes levantam e saem da sala, reclamando das uvas verdes. Aqueles que fazem parte do melhor pool genético e seguem lendo, o fazem porque já perceberam o potencial embutido na ferramenta.

Para você que ficou na sala, pense comigo: Se usando cara e coroa, nossas chances serão sempre de 50%, ao longo do tempo, nossos resultados tendem a ser NULOS, pois teremos algo próximo a 5 operações vencedoras para cada 5 operações perdedoras.

No entanto, basta uma pequena esperança matemática positiva para virar o jogo das probabilidades ao nosso favor. Se aumentarmos para apenas 60% nossas probabilidades de acerto, teremos cerca de 6 operações vencedoras para cada 4 operações perdedoras ao longo do tempo. Com o devido gerenciamento, isso significa lucro no bolso.

E eu já mencionei que alguns padrões de AT oferecem (segundo minhas observações pessoais) até 80% de probabilidades de acerto? Puxa, que pena que as raposas abandonaram a sala e não escutaram essa.

Premissas Equivocadas

A maioria dos iniciantes no mercado financeiro começa a operar com base em premissas totalmente equivocadas, tantas são elas que, por respeito à sua paciência (e ao tamanho deste artigo),  me privarei de enumerá-las. Elas abundam nos materiais oferecidos pelas corretoras, e são consideradas muito úteis por todos aqueles que se esquecem que corretoras vivem basicamente de… corretagem. A Análise Técnica mal feita, e voltada para operações intraday (comprar e vender várias vezes no mesmo dia) é apenas uma delas. Resista a essa tentação.

Se você tem que acompanhar as cotações o dia todo para decidir seus pontos de entrada e saída, perde tempo precioso, e se deixa contaminar por notícias, por movimentos inesperados, por palpites alheios, e por todas sorte de RUÍDOS. Há música na dança dos preços, e o analista técnico bem treinado tem o ouvido apurado para escutá-la, por trás desses ruídos.

Acompanhe os próximos artigos aqui no O Ponto Base, onde aprofundaremos juntos o nosso conhecimento acerca dessa arte. Além dos artigos, publicarei regularmente análises em vídeo, exemplificando aquilo que considero um bom uso da AT.

Garanto que as probabilidades de você ficar tão fascinado pelo assunto quanto eu, e começar a tirar real proveito dele, são bem maiores do que 50%.

Um Forte Abraço.